EP. 11. FESTA DE JUNHO PT.2
- Jéssica Sanz
- 13 de jan.
- 17 min de leitura
SUNNY
quarta
16h25
Saí da sala de reunião já checando as mensagens na pulseira. Estava animada, esperando a resposta de Taesung ao ter feito o convite mais cedo, mas a resposta foi um balde de água fria.
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Sunny
Vamos nos encontrar na troca de turno?
Tae
Eu tenho um compromisso. A agenda está difícil com a gincana.
Sunny
Claro. Boa sorte com isso, então.
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Dei um suspiro e continuei andando pelo campus. Ele poderia ter falado qual o compromisso em vez de me deixar curiosa. De todo modo, fui para o bloco de Música. Precisava pegar alguns itens para a gincana, e estava até mesmo na esperança de esbarrar com ele por ali. Realmente, foi o que aconteceu, mas não foi uma surpresa tão boa quanto eu esperava.
Ouvi a voz dele ao passar na frente de uma das salas de ensaio, que estava com a porta entreaberta.
— Isso! Você foi muito bem!
Eu não costumava fazer aquele tipo de coisa, mas não consegui me conter. Empurrei um pouco a porta e espiei. Ouvi a voz da outra pessoa bem quando conseguia ver os dois pela fresta.
— Eu achei que isso seria bem mais difícil — disse Maya.
Os dois estavam com roupas casuais de atividade física, e pareciam um pouco suados e cansados.
— Eu acho que você tem um talento nato para isso.
Recuei, um pouco impactada com aquilo. Não era nada demais, mas mesmo assim, não era algo pelo qual eu estivesse esperando.
Me afastei silenciosamente da sala e continuei meu caminho para onde eu precisava. Peguei os itens e os levei até a quadra onde aconteceriam as atividades da noite.
Coloquei a caixa no chão e comecei a arrumar as coisas, mas estava com a cabeça nas nuvens, pensando naquilo. Ele poderia ter me contado, mas escolheu esconder de mim. Tentei pensar que não era nada demais, ou, quem sabe, que a intenção era que fosse uma surpresa… Só que eu não conseguia pensar dessa forma.
Ouvi vozes conhecidas rindo e, em reflexo, olhei. Guilherme estava trazendo mais itens em uma caixa, acompanhado por Duda. Os dois pareciam estar se divertindo durante uma conversa, e foi difícil não sentir um pouco de inveja daquele momento tão simples, mas eu consegui sorrir pela felicidade deles.
— Tá tendo ajuda hoje, então? — comentei, enquanto eles deixavam as caixas no chão.
— Espero que a comissão organizadora não se importe — disse Duda, simpática.
— Não, a ajuda é sempre bem-vinda — eu sorri, lembrando do dia em que a conheci. — E me traz boas memórias.
Pelo sorriso de Duda, percebi que ela se lembrou do mesmo que eu.
— Então, Duda, seu time está se preparando para a última prova?
— Tá falando da coisa do rei e rainha? — perguntou ela, não muito animada. — Ah, ainda estamos decidindo. Ninguém na Amazonita parece muito… animado para dançar.
— Ah, se eu fosse você, eu pensaria melhor. Sua amiga Maya já está preparando uma performance.
Guilherme virou um pouco o rosto, preocupado.
— Tem certeza de que devia vazar essa informação? — perguntou ele.
— Ah, elas são roomates — eu disse. — Não é como se Maya não fosse contar em algum momento.
— O jeito como você disse “sua amiga” faz parecer que ela não é sua amiga — notou Duda, perspicaz. Talvez eu estivesse deixando claro demais que havia algo me incomodando, mas eu sentia que precisava falar sobre aquilo.
— Não é nada demais — eu disse, me concentrando em arrumar as coisas. — Aliás, eu nem tenho certeza de nada, mas… eu acho que Maya e Taesung podem estar preparando algo. Eu realmente espero que você não compartilhe essa informação com seus amigos, mas… é bom vocês se prepararem. Se ninguém do seu time quer, talvez você deva tentar. A Amazonita não pode ficar sem representante!
— Ela tá certa! — disse Guilherme, parecendo animado com a ideia. — Eu acho que você conseguiria uma boa performance pro seu time.
— Com quem? — perguntou Duda, como se não houvessem opções.
— Você tem dois bons partidos num corpo só, é só escolher um dos dois — eu brinquei.
— Ah, claro — disse ela, irônica. — Porque é muito fácil lidar com essa dupla personalidade. Felipe e Vermelho vivem em pé de guerra.
— Talvez seja uma boa oportunidade para fazê-los cooperar — sugeri.
Duda pensou um pouco.
— É… Eu tenho um plano sobre isso.
DUDA
quarta
18h42
— A gente precisa conversar — eu disse.
— A gente quem? — perguntou meu parceiro, embora eu não soubesse bem com quem eu estava falando, mesmo estando com minha perna esquerda amarrada à perna direita dele.
Fazia alguns minutos que tinha começado a atividade da noite, a corrida de três pernas. Eu tinha escolhido a criatura bipolar como minha dupla, no momento em que ele era Felipe. Agora, estávamos em um ponto aleatório da pista de corrida que serpenteava por todo o campus, esperando a dupla vizinha chegar para que pudéssemos fazer a nossa parte do trabalho. As demais duplas estavam espalhadas na pista, na mesma linha, mas a uma distância segura. O fato era que, como eu estava meio abraçada ao meu parceiro, pronta para correr, não conseguia olhar nos olhos dele para saber se ele tinha mudado ou não de personalidade.
— Na verdade, nós três precisamos conversar. É uma decisão para ser tomada em conjunto.
— Ah, bom. Pode falar comigo e depois falar com o pirralho.
Vermelho. Claro que era ele.
— Tudo bem. Acontece que ninguém no nosso time se candidatou para o lance de rei e rainha.
— Espera, você tá querendo que a gente dance na frente de todo mundo só pra talvez ganhar um título besta?
— Um título besta e 50 pontos pra Amazonita.
— Ok, me convenceu. Eu vou fazer o que tiver que fazer pra ganhar esse negócio.
— Tudo bem. Me deixa falar com Felipe.
— Agora? E se a outra dupla chegar?
— Felipe sabe correr bem, você não precisa subestimá-lo.
— Ai, tá bem — disse ele com preguiça.
Ficamos um tempo em silêncio. Ele olhou para baixo, parecendo analisar a situação.
— Ah, corrida de três pernas.
— Você percebeu rápido! — elogiei.
— É meio difícil haver outro motivo pra eu estar com a perna amarrada. Além disso, esse era o plano de hoje. Mas achei que Vermelho iria querer correr.
— Ah, ele quer, mas eu preciso falar com você.
— Hum, estou curioso.
— É que não tem ninguém no nosso time querendo participar do lance do rei e da rainha.
— Quer dizer, aquela performance de casal no meio da Festa de Junho?
— Isso.
— E você acha que nós devemos nos candidatar? — Felipe não parecia muito confiante.
Olhei para trás, checando que finalmente era possível ver as duplas se aproximando, mas tentei não apressar a conversa.
— Eu sei que pode parecer loucura com essa sua questão com seu amigo… mas ele já topou.
— Sério? Ele topou?
— Ele adora uma competição.
— Ah, é claro — Felipe fez parecer que era uma dedução óbvia.
— Só falta você também querer.
— Bom… eu não sou nenhum pé-de-valsa, mas… acho que damos um jeito de ao menos representar nossa equipe com o mínimo de dignidade.
— Ótimo. Hora de correr!
— Eita — disse Felipe, antes de dar um tremelique.
— Tá pronto? — perguntei.
Vermelho ajeitou a postura.
— Vamos nessa.
Duplas de outras equipes alcançaram seus parceiros antes da nossa, mas fomos a terceira dupla a sair da nossa linha. Eu e Vermelho éramos bem determinados quando desafiados, então conseguimos nos sair bem.
A nossa parte da corrida durou alguns minutos que pareceram uma eternidade. Não conversamos no caminho para poupar energia, mas eu já estava exausta quando conseguimos encostar na próxima dupla.
A fileira seguinte partiu, e a maioria de nós caiu no chão sem sequer retirar as amarrações. Eu me abaixei e deitei, enquanto Vermelho ficou sentado do meu lado. Respirei fundo por mais um tempo, antes de retomar o assunto.
— Então, você tem alguma ideia para a performance? — perguntei, ainda ofegante.
Vermelho começou a desatar o nó.
— Que tal irmos direto para a sala de espelhos? Lá nós três poderemos conversar e decidir o que é melhor.
— Como assim? — me esforcei para me sentar, enquanto a faixa se afrouxava. — Vocês não vão tirar no par ou ímpar pra ver quem vai dançar?
Vermelho fez uma careta.
— Isso é possível, mas eu estou me esforçando para implementar uma boa convivência neste corpinho, algo realmente democrático, então… seria legal se todos pudessem participar. Além disso, se soubermos usar bem, esse problema pode virar uma vantagem. Dois estilos de dança em um só cara.
Ergui a sobrancelha, sorrindo, surpresa com a animação dele.
— Desse jeito você vai me deixar pra trás.
— De jeito nenhum — ele se levantou e estendeu a mão para mim. — Nós somos uma dupla.
Escondi o sorriso e aceitei o impulso para levantar.
— Nós somos um trio — eu corrigi.
SUNNY
sexta - Dia da Festa de Junho
14h23
Eu não sabia como teria disposição para aguentar a festa, já que estava desde cedo trabalhando por ela. Ainda assim, nada ficaria pronto no horário, porque não dependia só de mim. Alguns responsáveis por barracas iriam chegar quase na hora da festa, mesmo eu tendo solicitado antecedência.
Pelo menos, eu tinha Guilherme para me ajudar. Tinha outros alunos na Comissão Organizadora, mas nenhum deles era tão prestativo e confiável. Tudo bem, ele poderia não ser tão pró-ativo como eu, mas éramos bons parceiros.
Naquela hora, estávamos decorando com bandeirinhas a estrutura que tinha sido montada na frente do palco para delimitar o espaço das apresentações.
Perdi um pouco da concentração quando Taesung apareceu com mais alguns de seu time para deixar caixas na barraca. Enquanto outros conversavam, ele olhou para mim com um sorriso bobo e deu um tchauzinho tímido. Eu correspondi falhando em esconder o mesmo sorriso bobo e também acenei.
Depois que ele foi embora, eu continuei fazendo as coisas, meio distraída, com aquela cara de idiota encantada. Ele não chegava a ser meu namorado, mas mexia comigo de uma forma surreal.
— Essa coisa com o Taesung é séria mesmo?
O comentário despretensioso de Guilherme disparou um alerta vermelho na minha mente. Eu o encarei com leve desespero.
— Como você sabe disso? Espera, foi a Duda que te contou?
— Ei, peraí, ninguém me contou nada! — disse ele, na defensiva. — Eu só te conheço muito bem e… estou andando muito com você esses dias, sabe?
Não me dei por vencida, mas fingi que sim.
— Sei.
— Hum. Bom, eu sei que eu não devia me meter, mas você permite ao seu amigo dar uma opinião?
— Eu vou adivinhar: você acha muito cedo pra entrar em um relacionamento, porque eu acabei de terminar.
— Não é bem isso… — ele parecia um pouco relutante.
— Agora estou curiosa — confessei.
Ele pensou um pouco, certamente analisando se deveria ou não me falar aquilo.
— Eu espero que você não fique chateada comigo.
— Eu estou, hm, autorizando você a dar opinião na minha vida por cinco minutos, então, aproveita — eu disse.
Ele sorriu, ainda hesitante, mas começou a escolher as palavras com cuidado.
— Tudo bem. Bom, é que… como você sabe, eu também sou amigo do Jae — quando ele disse isso, eu imediatamente me arrependi de ter permitido, mas não o interrompi. — Eu conheço vocês há um bom tempo, mas vocês se conhecem há muito mais, desde que se conhecem por gente… Sempre se deram bem, eram um casal de ouro, pelo menos pelo que eu conseguia perceber. Sei que talvez sua impressão seja diferente, mas… me pareceu muito repentino. Em um dia, tudo estava bem e, do nada, por causa de uma única discussão, você desiste de toda a conexão que criaram durante todos esse anos. E se apaixonar tão rápido por alguém que você acabou de conhecer faz menos sentido ainda.
— Ok, pra começar, quem disse que eu estou apaixonada? Ele é só um lance…
— Seu olhar e seu sorriso denunciaram você — disse ele, com franqueza; parecia preocupado.
Eu soltei o ar, incrédula.
— Isso não quer dizer nada, Guile — eu disse, com descaso da reação dele. — É uma paixonite temporária. Não chega nem perto do que eu tinha com o Jae.
Ele ergueu as sobrancelhas, com incredulidade.
— Então por que terminar por algo tão bobo?
— Guilherme, eu não sinto mais nada pelo Jae. Não tenho como ficar num relacionamento se não tiver o básico, que é amor.
— Então, você mentiu que o amava por um tempo, ou deixou de amá-lo repentinamente?
Eu precisei pensar sobre isso.
— Acho que é mais a segunda opção.
— Bom, não se deixar de amar alguém que esteve ao seu lado por anos de uma hora pra outra.
— Pode ser difícil, mas aconteceu comigo — eu argumentei, e depois o encarei, franzindo o cenho. — Qual é o motivo disso, Guilherme? Parece até que você tá desconfiando de mim, eu não entendo.
Ele suspirou.
— É que… Olha, eu não devia falar isso, mas… eu sei como o Jae tá sofrendo. Se você o esqueceu de repente, o mesmo não aconteceu com ele. Eu me preocupo. E sei que não posso te forçar a se apaixonar de novo, nem nada… Mas, sei lá, talvez você esteja confusa ou precisando de um tempo…
— Eu conheço bem as minhas emoções, não se preocupe. Eu saberia se estivesse confusa, mas eu só… Não quero ver o Jae perto de mim. Só olhar pra ele já me incomoda. Você entende.
Ele virou um pouco o rosto, parecendo triste.
— Se eu entendo? Hm. Bom, eu vou ter que dizer que sim, não é? — ele assentiu, olhando para as bandeiras. — Você criou repulsa pelo cara que era tudo pra você — ele pronunciou como se tentasse se convencer. — Da noite pro dia.
— É — eu disse, com firmeza. — Foi o que aconteceu.
Ele assentiu novamente.
— Eu entendo. É uma pena, mas eu entendo.
Guilherme continuou prendendo algumas coisas na armação, e ficou aquele silêncio constrangedor enquanto eu apenas o observava. Decidi abraçá-lo. Ele estava triste, parecia decepcionado. Eu o puxei gentilmente pelo ombro para se virar para mim e o abracei.
— Eu sinto muito se minha decisão te desagrada — eu disse. — De verdade, eu não quero magoar ninguém. Nem você, nem o Jae. Mas essas decisões cabem apenas a mim.
— Eu sei — disse ele, correspondendo ao abraço. — Eu tive receio de falar sobre isso, porque não é assunto meu. Eu só tô triste por ele…
— Então preciso que me prometa que vai tentar ser o melhor amigo pra ele.
Ele me soltou parcialmente.
— É o que eu tô tentando.
Como se fosse a materialização dos meus pesadelos, eu o avistei por cima do ombro de Guilherme. Jae tinha surgido do nada como uma sombra, segurando uma caixa que parecia conter itens de decoração e mantendo muitos metros de distância.
Como que em reflexo, eu soltei Guilherme.
— Bom, melhor adiantarmos — eu disse. — Ainda há muito trabalho para fazer.
— É verdade — disse ele, começando a recuperar seu bom humor com um sorriso frágil. Ele continuou amarrando bandeirinhas, e eu peguei mais itens para pendurar.
Finalmente, Jae começou a andar na nossa direção. Ele chegou perto de nós e colocou a caixa no chão.
— Alfa pediu pra trazer isso — ele disse, já saindo.
— Valeu, parça — disse Guilherme, um pouco alto, para garantir que seria ouvido.
Realmente, Jae andava cabisbaixo desde a fatídica ocasião. Eu já estava acostumada a vê-lo sempre de preto e inexpressivo, mas aquilo era diferente. Ele estava desmotivado.
Vê-lo daquele jeito me doía, mas eu sabia que não era só por ele estar triste. Nossa quebra havia sido feia demais, e eu sabia que os cacos tinham recaído muito mais sobre ele, mas eu me sentia incomodada quando ele estava por perto. Não parecia mais certo. No início do ano, estar com ele era a única certeza que eu tinha em meio a tanto caos; era realmente admirável o quando as coisas tinham mudado.
DUDA
sexta - dia da Festa de Junho
17h21
Cheguei no dormitório exausta cansada pelo ensaio final. Lidando com dois parceiros em um único corpo e uma única coreografia, eu estava tendo que me esforçar mais do que seria normal. Prova disso foi encontrar minha colega de quarto se arrumando tranquilamente.
Eu sorri ao vê-la. Ela já estava com seu vestido xadrez em tons de rosa, sentada na penteadeira, de cabelo pronto, fazendo a maquiagem. A cor era para representar seu time, e nós já tínhamos contado uma a outra que seríamos rivais na batalha final, mas isso não abalou nossa convivência. Felizmente, Maya era madura como eu para encarar a gincana como uma simples brincadeira. Eu já não poderia garantir o mesmo dos meninos.
— Caramba, Duda, olha a hora! — disse ela, espantada, ao perceber minha entrada, embora não tivesse tirado a atenção da tarefa em curso. — Já era pra você estar quase pronta.
Eu me joguei na minha cadeira para descansar um pouco; não estava com pressa.
— Relaxa, Maya — eu disse. — É uma festa, não a cerimônia de formatura.
— Último ensaio puxado?
— Como todos os outros. Acho que talvez tenha sido um erro insistir em ensaiar hoje.
— Talvez, mas eu aposto que o banho vai te revitalizar.
— Eu já vou, só quero deixar meu corpo esfriar um pouco.
Olhei para o vestido verde, um pouco parecido com o de Maya, que estava estendido sobre minha cama. Eu não era uma grande fã de vestidos, mas estava ansiosa para aquela festa. Ela parecia ser mais divertida do que a maioria das festas.
Esperei só mais dois minutos para ir para o banheiro.
— Você quer que eu te espere? — perguntou Maya.
Como ela já estava finalizando, resolvi não prendê-la.
— Não, pode ir. Eu devo demorar aqui, é melhor aproveitar.
— Ok, mas se apresse!
MAYA
sexta
17h31
Pouco depois de Duda entrar no banho, eu terminei a minha maquiagem. Fiz os últimos preparativos: coloquei as joias e os sapatos. Então, mandei uma mensagem para Felipe em minha pulseira.
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Maya
Eu estou descendo. Te encontro onde?
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Logo em seguida, alguém bateu na porta, e eu sorri. Deveria ser ele, então me levantei e fui atender.
Em microssegundos enquanto eu abria a porta, meu cérebro raciocinou que, se Duda tinha acabado de chegar do ensaio, não tinha como Felipe já estar pronto.
No espaço entre a porta e o batente apareceu Taesung, usando seu terno xadrez rosa com uma blusa branca por baixo e uma flor roxa bem chamativa no bolso do paletó. Não tive grande sucesso em esconder minha surpresa e uma leve decepção, mas ele não pareceu se importar com isso.
— Tá fazendo o quê aqui? — perguntei, sutilmente.
— Eu… vim te buscar pra festa?
Eu olhei para o quarto brevemente; resolvi sair e fechar a porta para manter a privacidade de ambos os espaços.
— Mas nós só vamos dançar juntos, não precisamos chegar juntos.
— Eu sei, mas estava pensando que seria bom ficarmos próximos durante a festa, para manter nossa sintonia, você sabe.
Suspirei levemente.
— É, mas eu tenho um namorado — eu olhei para os dois lados do corredor, antes de sussurrar para ele. — E você não está muito longe disso.
Ele suspirou.
— Olha, a Sunny tá na organização, ela vai ficar envolvida com isso a noite toda, então… eu não queria ficar sozinho. Mas, sem problema! Eu entendo. Você quer curtir o seu namorado. Posso contar com você meia hora antes da apresentação?
— Pode — eu disse, pensativa. — Olha, eu acho que o Felipe vai demorar, então… Já que está aqui, podemos ir. Mas, quando eu o encontrar…
— Já entendi. Não se preocupe, não vou ficar de vela.
Eu segurei um riso, com um pouco de pena dele, e começamos a andar para o elevador.
— Não se preocupe, eu aposto que a festa vai estar muito divertida. E aquele seu amigo, Jihyung?
— É, ele vai estar lá, quem sabe eu colo com ele…
Chegou uma mensagem.
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Felipe
Mais tarde um pouco, eu ainda estou me arrumando e tenho que fazer uma coisa antes. Pode ir sem mim.
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Franzi o cenho, mas não discuti. Ao que parecia, Taesung teria muito tempo comigo.
SUNNY
sexta
17h38
Eu preferi me arrumar mais cedo na velocidade da luz para ficar despreocupada com isso. Sabia que os últimos preparativos para a festa no ginásio requereriam minha presença, e eu não queria correr o risco de ser vista suada e descabelada pelos primeiros a chegarem.
Normalmente, eu usaria roxo para representar a minha atlética, mas, naquela noite, isso seria representar a Fluorita, e eu não podia. Então, estava usando um conjunto xadrez de top e saia em tons de preto e branco. Meu cabelo estava solto, com duas xuquinhas altas.
Eu estava com uma prancheta passando de barraca em barraca para checar se estava tudo ok. Depois disso, precisaria correr para o som. Isso se ninguém me interrompesse no meio do caminho.
— Cheguei, chefe! — anunciou Guilherme, aparecendo com um paletó que o fazia parecer um tabuleiro ou uma pista de corrida, com vários quadrados largos pretos e brancos.
— Ai, até que enfim — eu disse. — Eu preciso que você corra na sala da atlética para pegar a caixa de lançadores de confetes que tá em cima da mesa — eu joguei a chave pra ele.
— É pra já.
— Precisa de ajuda?
A voz me fez gelar. Eu precisava de muita ajuda, e deveria ficar feliz com a oferta, mas não vinda dele.
Me virei lentamente para encarar Jae.
Mesmo descompromissado com as atividades da gincana, ele estava todo de preto, como geralmente ficava. O único resquício da Festa de Junho era o padrão xadrez na parte interna de sua jaqueta. Eu precisei pensar um pouco no que iria dizer, e forcei um sorriso.
— Claro, tem muita coisa pra fazer, você pode dar uma circulada e ver quem precisa do quê.
— Quer que eu cheque o som pra você?
Novamente, a pergunta me surpreendeu. Era uma das tarefas das quais eu tinha medo de não dar conta, e ele era uma das poucas pessoas que eu confiaria para isso.
— Se você puder…
— Claro, deixa comigo — disse ele, calmamente, e foi em direção ao pequeno palco, onde a mesa de som já estava instalada.
As danças da Festa de Junho geralmente envolviam muita gente, então elas aconteceriam no chão, em um espaço delimitado no meio da festa. Além das barracas de comida, com algumas mesas para refeição, e as barracas de jogos, havia espaço livre para circular. Toda a quadra estava enfeitada com muitas cores, com fitas e correntes penduradas por todo o teto.
Olhando para cima, me permiti um suspiro de satisfação. Tudo estava perfeito.
DUDA
sexta
18h45
Quando eu cheguei, a festa já estava consideravelmente cheia. Muitos estudantes e alguns professores circulavam pela festa com suas roupas xadrez coloridas, visitando as barracas ou apenas conversando em grupos. A música animada, porém em volume suave, preenchia o ambiente, onde os aromas das comidas se misturavam; tudo parecia estar uma delícia.
Eu cheguei pelas sombras, usando o vestido verde. A frente do meu cabelo estava trançada para trás, onde os cachos mantinham seu volume habitual. Além disso, eu estava segurando, em minhas mãos enluvadas, um bloquinho de placas de vidro com formatos diferentes. Cada bloquinho tinha, amarrado em si, um fio de náilon quase invisível.
Fiquei entre duas barracas, observando tudo por alguns minutos, até que meus olhos encontraram Felipe, do outro lado. O terno dele tinha o mesmo padrão de xadrez e tom de verde que o meu vestido. Ele estava ao lado da mesa de som, olhando para as placas em suas mãos. Pouco depois, ele levantou o olhar e me encontrou.
Eu abri um sorriso confiante e assenti. Ele também fez um sinal com a cabeça.
Me aproximei da extremidade da barraca à minha direita. A estrutura dela tinha pilares nos quatro cantos, e estava toda enfeitada no tema da festa. Como se fosse muito natural, destaquei uma das placas da pilha e amarrei o fio dela no pilar.
Fui para trás da barraca, que estava bem próxima do limite da quadra, e andei mais umas três barracas antes de repetir o processo em outra. Enquanto amarrava o náilon, observei Felipe fazendo o mesmo nos pilares de bambu que ajudavam a delimitar o espaço de dança. Ele se misturava com algum grupo, para não ficar muito exposto, e o fazia. Como sempre, ele transparecia insegurança.
— Posso saber o que a senhorita está fazendo? — a voz de Guilherme não soou tão ameaçadora quanto deveria. Um membro da organização da gincana estava me flagrando fazendo algo suspeito, mas ele era meu namorado, e era inofensivo.
Apesar disso, eu tentei disfarçar um pouco o repentino nervosismo pelo flagrante.
— Colaborando com a decoração? — perguntei, antes de ajustar a peça para que ficasse bem visível.
— Isso é algum tipo de decoração retrô?
— É, tem a ver com reciclagem e tal.
— E não tem nada a ver com o fato do seu parceiro de gincana ter bipolaridade?
Talvez eu tenha ficado um pouco pálida, mas tentei me tranquilizar. Guilherme não parecia realmente querer criar um problema.
— Eu não vou confirmar nem negar essa informação.
Ele deu um suspiro com um sorriso, olhando para o lado, e voltou a me encarar.
— Eu vou confiar na sua integridade. Espero que saiba o que está fazendo.
— Guilherme, ele tem um problema. A bipolaridade é um problema, e isso é uma tentativa de reparação. Viva a equidade?
Abri um sorriso enorme e falso que dizia “por favor, não estrague meu plano”.
— Como eu disse, eu vou confiar na sua integridade. Se você acha que isso não é trapaça, eu confio que não seja.
Ele se inclinou rapidamente para me surpreender com um selinho antes de se afastar.
Continuei pendurando pedaços de espelho em locais estratégicos por mais alguns minutos, e fui encontrar Felipe quando eles acabaram. Conversamos enquanto ficávamos de olho na festa.
— Tudo certo? — perguntei.
— Tudo. Ninguém achou ruim. Eu vi que Guilherme falou com você.
— Ele não é problema. A única pessoa que poderia encrencar mesmo seria a Sunny, mas… ela tá muito ocupada.
— A Sunny não é super sua amiga?
— Ela é, mas… Não sei como ela veria isso.
— Acha que estamos fazendo errado?
— Não — eu disse, com firmeza. — Você e Vermelho têm direito a usar esse corpo. Os dois têm direito a participar das atividades, e essa é a melhor maneira.
Meus olhos alcançaram Maya e Taesung, que estavam juntos na barraca de tiro ao alvo. Pensei em convidar Felipe para jogar alguma coisa, mas tive uma ideia melhor.
— Que tal a gente se separar? O Taesung tá igual carrapato atrás da Maya.
Felipe olhou para onde eu estava olhando.
— Ela parece estar se divertindo.
— Para de ser trouxa, cara — disse Vermelho, no espelho mais próximo. — É a sua namorada ou não é?
Felipe deu um suspiro para tomar coragem.
— Aproveita enquanto não é minha vez de curtir a festa — sugeriu Vermelho, quando Felipe já começava a andar em direção à referida barraca. Inevitavelmente, o espírito sumiu depois.
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